Santo Agostinho de Hipona foi um pensador e teólogo da filosofia patrística, movimento que buscava criar bases filosóficas para o cristianismo, durante a transição entre a Antiguidade e a Idade Média. Ele desenvolveu ideias que influenciaram a cultura ocidental de forma significativa, como a adaptação da teoria platônica à religião e a questão do livre arbítrio.
Até hoje Santo Agostinho é considerado um dos filósofos mais importantes do cristianismo e influenciou outros pensadores, como São Tomás de Aquino, João Calvino e Martinho Lutero. Neste artigo, vamos abordar a biografia de Santo Agostinho, seus principais livros e ideias.
O artigo passará pelos seguintes conteúdos:
Quem foi Santo Agostinho?
Santo Agostinho foi um escritor, teólogo, filósofo e bispo da igreja católica, responsável por criar uma filosofia teocêntrica, que antecedeu a perspectiva antropocêntrica renascentista. Ele nasceu no dia 13 de novembro de 354 d.C. na cidade de Tagaste, que era uma província de Roma na Numídia, localizada no norte da África (cidade que atualmente fica na Argélia).
Foi batizado pelos seus pais como Aurelius Augustinus e teve dois irmãos, Navígio e Perpétua. Tornou-se um dos maiores responsáveis pelo pensamento cristão na Idade Média e uma das vozes mais influentes da história da filosofia ocidental.
Sua mãe, Mônica, era uma cristã fervorosa. É tanto que após a morte foi canonizada como Santa Mônica pela Igreja. Já o seu pai, Patrício, era pagão e tinha uma pequena propriedade de terras em Tagaste. Santo Agostinho teve uma infância marcada pela vivência no campo, junto a lavradores que trabalhavam nas plantações de oliveiras.
Aos onze anos de idade, ele é enviado para a cidade de Manduria para estudar literatura e oratória. Muito dedicado aos estudos, ele lia e decorava trechos de poetas e prosadores latinos, como Virgílio e Terêncio. Ele confessa posteriormente, em sua autobiografia Confissões, que nessa fase de sua vida ele se “saciou de baixezas”.
Terminado os estudos, ele retorna para Tagaste e aos 17 anos de idade segue para a cidade de Cartago, onde iria estudar retórica. Lá, conhece uma jovem cartaginense de nome desconhecido, com quem mantém um relacionamento amoroso de cerca de 15 anos e com quem tem um filho chamado Adeodato. Sua mãe era contra esse relacionamento porque não houve um casamento formal.
Para conhecer mais sobre a vida e a obra de Santo Agostinho, acesse o curso Santo Agostinho: Uma Introdução, que aborda o desenvolvimento filosófico e espiritual do bispo de Hipona.
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Santo Agostinho: Maniqueísmo, Influências e Canonização
Aos 19 anos de idade, Santo Agostinho entra em contato com um texto de Cícero, chamado Hortensius, uma obra atualmente perdida, mas que o impactou significativamente pelo teor filosófico que refletia sobre a busca da verdade. Outro conceito que foi fundamental para sua formação filosófica foi a doutrina maniqueísta, fundada por Mani (ou Maniqueu), um profeta persa.
Para o maniqueísmo, a existência é pautada por uma dualidade entre o bem e o mal. O bem seria o reino da luz, governado por Deus e mal seria o reino das trevas, regido por forças demoníacas. Nessa doutrina, a salvação humana seria alcançada pelo conhecimento e pela prática ascética, pautada pela abdicação de prazeres mundanos e dos desejos corporais. Para o maniqueísmo, Jesus Cristo seria uma encarnação de Deus na luta contra o mal.
Após sua formatura em Cartago, ele passa a ensinar retórica em Tagaste mas não fica muito tempo por lá e logo volta para Cartago no intuito de ensinar. Entretanto, surge uma oportunidade para dar aula em Roma e ele a aceita. Lá, Agostinho faz amizade com o prefeito, Símaco, também maniqueísta e o indica para trabalhar como professor da corte imperial em Milão.
Após passar anos como adepto ao maniqueísmo, Santo Agostinho se converte ao cristianismo, muito devido à pregação do bispo de Milão, Santo Ambrósio, e por sua intensa busca de desenvolvimento interior. Agostinho foi batizado por Santo Ambrósio em 387 d.C.
Em Milão, ele conhece a obra de Plotino, As Enéadas. É quando entra em contato com o neoplatonismo que o encanta inicialmente e que será uma teoria essencial para formar sua teologia, que aproxima o platonismo do cristianismo.
Após a morte de seu filho e de sua mãe, Santo Agostinho decidiu vender todo o patrimônio da família e doar o dinheiro aos pobres. Ficou apenas com sua casa, que transformou em um mosteiro.
Santo Agostinho passa a se dedicar ao desenvolvimento de uma filosofia cristã, onde deseja equilibrar a razão e a fé. No ano de 396 d.C ele se torna bispo em Hipona, cargo eclesiástico que ocupará até sua morte, em 460 d.C. A obra de Agostinho é influenciada pelos escritos de Paulo de Tarso e pelo neoplatonismo de Plotino. Até o fim da vida, ele dedicou-se às pregações e aos escritos, mantendo uma vida simples.
Foi canonizado por aclamação popular, e reconhecido como Doutor da Igreja, em 1292, pelo papa Bonifácio VIII. Santo Agostinho é considerado Santo tanto pela Igreja Católica quanto pela Anglicana.
O Dia de Santo Agostinho é celebrado em 28 de agosto, data de sua morte. A homenagem a Santa Mônica, sua mãe, ocorre no dia 27 de agosto, também em memória de seu falecimento. Ambas as datas possuem profundo significado religioso, celebrando o legado espiritual e histórico dessas figuras fundamentais para a Igreja Católica.
Agostinho e a Filosofia: Rumo à Compreensão da Graça
Santo Agostinho buscou entender a relação entre a razão humana e a graça divina, um tema central em sua filosofia. Sua obra Confissões (397-400 d.C.) é uma das mais importantes nesse contexto, pois Agostinho reflete sobre sua própria conversão ao cristianismo e os dilemas existenciais que o levaram a buscar a verdade em Deus. O livro é um profundo exame da alma humana e uma tentativa de compreender o papel da graça na transformação.
O conceito de graça foi central para Agostinho, que argumentava que os seres humanos, devido ao pecado original, estavam irremediavelmente distantes de Deus e precisavam da intervenção divina para alcançar a salvação. A liberdade humana, para ele, não significa a possibilidade de escolher o bem sem a ajuda de Deus, mas sim uma liberdade redimida pela graça.
Assim como o conceito de graça, o conceito de livre-arbítrio foi essencial para Santo Agostinho. Os professores Franklin Leopoldo e Silva e Oswaldo Giacoia Junior esclarecem os principais conceitos do pensamento de Agostinho na 2ª temporada da trilha da filosofia. A série é uma jornada sobre os principais pensadores, temas e conceitos da história da filosofia.
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Principais Livros de Santo Agostinho
Santo Agostinho possui uma produção literária vasta, que aborda questões filosóficas e teológicas profundas. Seu pensamento influenciou a história da mentalidade ocidental. Em seus textos, discorre sobre temas como espiritualidade, metafísica, ética e política.
Entre suas obras mais importantes está o livro Confissões (397 - 400 d. C), considerada a primeira autobiografia da literatura ocidental e a obra A Cidade de Deus (413-426 d.C.), um verdadeiro marco para compreender sua visão de mundo.
Outra de suas grandes obras, A Trindade (400-416 d.C.), é uma extensa reflexão teológica, composta por 15 volumes, na qual Agostinho examina a natureza da Trindade e o mistério da divindade nas três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. A obra apresenta um aprofundamento na questão da unidade de Deus, tema central na teologia cristã. Seus pensamentos sobre o pecado original, a graça divina, a liberdade humana e a relação entre fé e razão são fundamentais para o desenvolvimento da teologia cristã ao longo dos séculos.
Abaixo estão os principais livros que sintetizam seu pensamento e sua visão de mundo:
- Solilóquios (386 - 387 d.C)
- A Vida Feliz (386 d.C.)
- A Trindade (400-416 d.C.)
- Contra os Acadêmicos (386 d.C)
- A Ordem (386 d.C)
- A Grandeza da Alma (388 d.C)
- O Mestre (389 d.C.)
- A Cidade de Deus (413-426 d.C.)
- A Natureza e a Graça
- O Dom da Perseverança (428 - 429 d.C.)
A Cidade de Deus (413-426 d.C.)
Uma das mais importantes obras de Santo Agostinho, A Cidade de Deus foi escrita como uma defesa da fé cristã após o saque de Roma pelos visigodos em 410 d.C. O livro oferece uma reflexão profunda sobre a história humana, delineada entre a “cidade celestial”, representada pelos cristãos, e a "cidade terrena", que simboliza o mundo secular e suas corrupções. Agostinho argumenta que, embora os cristãos habitem o mundo material, sua verdadeira pátria é a cidade celestial. Nesse sentido, ele propõe que a história transcorre como um campo de batalha entre a disputa dos valores espirituais e mundanos.
Na obra, ele defende o cristianismo contra as acusações de ser responsável pela decadência da civilização romana e faz uma análise profunda sobre a história da humanidade, a providência divina e a eternidade.
Confissões de Santo Agostinho (397 - 400 d. C)
Confissões (397 - 400 d. C) é considerada a primeira autobiografia da literatura ocidental e é um dos textos mais conhecidos de Santo Agostinho. No seu relato, ele compartilha com sinceridade sua jornada de vida antes da conversão ao cristianismo. Ele examina temas como o pecado, o hedonismo, o maniqueísmo e as suas próprias contradições internas, oferecendo uma reflexão crítica sobre suas falhas e suas buscas existenciais. Além disso, a obra narra detalhadamente sua conversão tardia à fé cristã, revelando o processo doloroso de sua aceitação de Deus após anos de experimentação filosófica.
Santo Agostinho: Teologia e Filosofia Patrística
Santo Agostinho está inserido no período histórico e filosófico conhecido como Filosofia Patrística, uma fase fundamental para a elaboração do pensamento cristão e para a consolidação da Igreja no cenário intelectual do início da Idade Média. A expressão patrística se refere ao conjunto de doutrinas, reflexões e discussões teológicas e filosóficas desenvolvidas pelos primeiros Pais da Igreja, que foram líderes religiosos e pensadores da fundamentação da fé cristã.
O Desafio da Patrística: Fundar o Pensamento Cristão
O contexto da filosofia patrística foi marcado pela necessidade de estabelecer as bases de um sistema de pensamento cristão que fosse capaz de dialogar com o conhecimento filosófico clássico, convencer os fiéis e fornecer sustentação às doutrinas cristãs em meio a tensões religiosas e filosóficas. Nesse período, a Igreja enfrentava desafios, como a diversidade de interpretações teológicas, as heresias e a resistência do mundo pagão, sendo essencial a criação de argumentos lógicos e filosóficos que fundamentassem os princípios da fé cristã.
Antes do surgimento da filosofia patrística, o neoplatonismo era uma referência importante no cenário filosófico, com suas tentativas de resgatar e reinterpretar conceitos da filosofia de Platão sob novas abordagens.
A Contribuição de Agostinho à Filosofia Patrística
Santo Agostinho seguiu a linha de pensamento defendida por Justino, ao afirmar que a filosofia grega antiga, embora pagã, continha princípios e conhecimentos que poderiam ser aproveitados para explicar questões fundamentais da fé cristã. Ele entendeu que a razão e a filosofia poderiam ser aliadas da teologia na busca pela verdade divina, tornando-se, assim, um dos maiores representantes da síntese entre a filosofia clássica e a doutrina cristã.
Como um dos mais importantes pais da Igreja, Agostinho integrou elementos do neoplatonismo ao seu pensamento, adaptando-os para oferecer respostas às questões espirituais e teológicas de sua época. Seu legado inclui discussões sobre o pecado, a liberdade humana, a bondade de Deus, a relação entre o tempo e a eternidade, e a busca pela verdade através da introspecção e do conhecimento.
Principais ideias de Santo Agostinho
A filosofia de Santo Agostinho é marcada por sua tentativa de harmonizar a fé cristã com a razão filosófica. Influenciado pela obra de Platão, ele integrou conceitos da filosofia platônica em sua teologia, adaptando-os de maneira única à luz da experiência cristã. Além disso, Agostinho foi impactado pelo pensamento estóico, particularmente no que diz respeito à moralidade e à natureza da alma, com ênfase na busca pela virtude e no controle das paixões.
Santo Agostinho também foi o responsável pela formulação da doutrina do pecado original, uma ideia fundamental para a teologia cristã, e pela teoria da guerra justa, que propõe princípios éticos para a justificação da guerra em determinadas circunstâncias.
Entre suas principais contribuições filosóficas e teológicas, destacam-se os seguintes conceitos:
IDEIAS DE SANTO AGOSTINHO | RESUMO |
---|---|
Pecado Original | A ideia de que todos os seres humanos herdaram o pecado de Adão e Eva, o que impede a salvação sem a intervenção divina |
Graça Divina | A crença de que a salvação humana só é possível por meio da graça de Deus, que capacita os seres humanos a escolherem o bem |
A Cidade de Deus | A visão de que a história humana é uma luta entre a Cidade Celestial (cristã) e a Cidade Terrena (secular) |
Livre Arbítrio | O livre-arbítrio é a capacidade humana de escolher entre o bem e o mal, mas a liberdade plena só é possível com a graça divina |
Frases de Santo Agostinho
Santo Agostinho é conhecido por suas reflexões profundas sobre a alma humana, a graça e o amor a Deus. Algumas de suas frases mais conhecidas são:
- "Tu criaste-nos para Ti, e o nosso coração está inquieto enquanto não descansar em Ti." (Confissões)
- "Fazei, Senhor, que eu seja casto, mas não agora." (Confissões)
- "A medida do amor é amar sem medida."
- “Com o coração se pede. Com o coração se procura. Com o coração se bate e é com o coração que a porta se abre”
- “Não é tanto o que fazemos, mas o motivo pelo qual fazemos que determina a bondade ou a malícia”
Conclusão
Santo Agostinho permanece como uma figura fundamental na história do pensamento cristão, cujas contribuições intelectuais atravessaram séculos e continuam a influenciar profundamente a teologia e a filosofia até os dias de hoje. Suas ideias sobre a graça divina, o pecado original, a relação entre fé e razão, e o livre-arbítrio formaram o entendimento cristão de questões centrais da espiritualidade e da moralidade.
A sua obra, especialmente livros como Confissões e A Cidade de Deus refletem a jornada pessoal de fé e busca pela verdade e oferecem uma visão profunda sobre o papel do ser humano na história e na relação com Deus. Em sua busca por harmonizar a razão com a fé, Agostinho estabeleceu as bases para a filosofia cristã medieval, cujo impacto ressoa até a contemporaneidade, tornando-o uma das figuras mais relevantes da história da Igreja Católica.
Perguntas Frequentes sobre Santo Agostinho
Quem foi Santo Agostinho?
Santo Agostinho foi um filósofo e teólogo cristão do século IV e V, cujas obras influenciaram profundamente a filosofia ocidental e a teologia cristã. Ele é considerado um dos quatro grandes Padres da Igreja Latina.
Quais são as principais ideias de Santo Agostinho?
As principais ideias de Santo Agostinho incluem a doutrina do pecado original, a necessidade da graça divina para a salvação, o conceito de Cidade de Deus e sua reflexão sobre a relação entre razão e fé.
Referências:
https://curadoria.casadosaber.com.br/cursos/275/santo-agostinho-uma-introducao